Havia ainda o coração em algum canto. Nem o reconhecia. Sem meus melhores trejeitos,
ele andava pela casa atrás de cama e televisão. Um abandono mútuo de quando falta
muito pra não faltar mais nada. Entretanto, justo quando uma falsa ilusão do fim nos
tomou, eu o quis embaixo das asas. E quis muito ser visita. E terminar de ver aquele filme
do Kurosawa. Fazer a barba e ter dentes brancos. Recolocar as pilhas no rádio-relógio.
Acordar cedo e comprar jornal. Tirar fotos do entardecer, todos os dias. E ouvir a
respiração do pai pelo telefone. E entregar que pelo ontem já não posso mais.
E eu quero muito ser novo. De novo.
23 de set. de 2009
6 de set. de 2009
A menina de lá
Eu fico mais cheio de substantivos.
Reforçam o dobro do meu esforço pela revisão desta carta. Isso, e quem sabe mais, pela possibilidade mínima de rever "a menina de lá". Confesso que a memória peca demais. Perdoa. Fiquei o tempo de três músicas pra lembrar que não, em momento algum cheguei a te contar. Era assim que te nomeei pra contar nossas histórias aos outros, curiosos. O efeito surpresa perdeu-se depois.
O tabaco segue em menores freqüências. Não preciso relembrar minha pouca vocação para vícios de toda sorte. Quereria que acertasse mais alguns pormenores...
Augusto por exemplo, não ganhou efetivação. Perdeu muitos pontos com algumas atitudes tolas para a diretoria geral. Virou um chato clássico -não tem o que fazer e repara mais no que eu ando fazendo. Imaginei que citasse talvez o Osvaldo que pulava de alegria naquele aniversário do sobrinho, enquanto ouvíamos na vitrola Ahmad Jamal pra "viajarmos" todos juntos. E ele veio explicar, havia entendido enfim o sentido da palavra milagre. "Miracolo", dizia, é maravilhar-se - encantamento que valeria a crença de que o minuto vale vida inteira. Aí, admito a contradição com o tópico "memória" levantado no início.
Meus neurônios trabalham só pelo prazer dos mundos pequenos. Autismo em alto grau.
Deve ter questionado a demora, a falta de alarde, de notícias. Sabe que excita certa lentidão.
Meu masoquismo de esquina, lateja. Eu tinha que lapidar as melhores formas aqui dentro. Esperar o domingo chegar.
Preparar resposta pra todas as pequenas coisas. Isto é, as que realmente valem a pena. Infelizmente, toda essa escrita ainda guarda cheiros. E não preciso te adiantar o quanto o olfato é ponto frágil. As cartas vieram com aromas. Depois, teus telefonemas.
Já arranquei todos os fios do aparelho, e o celular, já entreguei as crianças aqui da rua.
Esse coração velho levantou cedo todos os dias. Usou o pretexto da pontualidade no expediente pra ter o máximo de rotinas.
De alguma forma, é querer te dizer: ainda dói. Cinematograficamente nada espetacular. Não mereceria grandes jantares, tampouco o derradeiro vinho chileno. Só quis um canto de castigo - olhar a parede fixamente, até tudo passar de forma gradual.
Tenho pensado demais. Mais.
O vaso de violetas sobreviveu. Reparei no mesmo dia que a carta chegou. Abri as janelas e ensaiei um grande tempo até levantar a aba com muito cuidado. Minhas cerimônias te impacientavam tanto que comemorei o gesto. Sério. Você é o "grande sem-querer".
O "miracolo" que viria me buscar.
E sim citando, quem sabe, de nuances: "Você, comigo vem e vai?".
Reforçam o dobro do meu esforço pela revisão desta carta. Isso, e quem sabe mais, pela possibilidade mínima de rever "a menina de lá". Confesso que a memória peca demais. Perdoa. Fiquei o tempo de três músicas pra lembrar que não, em momento algum cheguei a te contar. Era assim que te nomeei pra contar nossas histórias aos outros, curiosos. O efeito surpresa perdeu-se depois.
O tabaco segue em menores freqüências. Não preciso relembrar minha pouca vocação para vícios de toda sorte. Quereria que acertasse mais alguns pormenores...
Augusto por exemplo, não ganhou efetivação. Perdeu muitos pontos com algumas atitudes tolas para a diretoria geral. Virou um chato clássico -não tem o que fazer e repara mais no que eu ando fazendo. Imaginei que citasse talvez o Osvaldo que pulava de alegria naquele aniversário do sobrinho, enquanto ouvíamos na vitrola Ahmad Jamal pra "viajarmos" todos juntos. E ele veio explicar, havia entendido enfim o sentido da palavra milagre. "Miracolo", dizia, é maravilhar-se - encantamento que valeria a crença de que o minuto vale vida inteira. Aí, admito a contradição com o tópico "memória" levantado no início.
Meus neurônios trabalham só pelo prazer dos mundos pequenos. Autismo em alto grau.
Deve ter questionado a demora, a falta de alarde, de notícias. Sabe que excita certa lentidão.
Meu masoquismo de esquina, lateja. Eu tinha que lapidar as melhores formas aqui dentro. Esperar o domingo chegar.
Preparar resposta pra todas as pequenas coisas. Isto é, as que realmente valem a pena. Infelizmente, toda essa escrita ainda guarda cheiros. E não preciso te adiantar o quanto o olfato é ponto frágil. As cartas vieram com aromas. Depois, teus telefonemas.
Já arranquei todos os fios do aparelho, e o celular, já entreguei as crianças aqui da rua.
Esse coração velho levantou cedo todos os dias. Usou o pretexto da pontualidade no expediente pra ter o máximo de rotinas.
De alguma forma, é querer te dizer: ainda dói. Cinematograficamente nada espetacular. Não mereceria grandes jantares, tampouco o derradeiro vinho chileno. Só quis um canto de castigo - olhar a parede fixamente, até tudo passar de forma gradual.
Tenho pensado demais. Mais.
O vaso de violetas sobreviveu. Reparei no mesmo dia que a carta chegou. Abri as janelas e ensaiei um grande tempo até levantar a aba com muito cuidado. Minhas cerimônias te impacientavam tanto que comemorei o gesto. Sério. Você é o "grande sem-querer".
O "miracolo" que viria me buscar.
E sim citando, quem sabe, de nuances: "Você, comigo vem e vai?".
3 de set. de 2009
Vasta comilança.
"Ninguém quer discutir; ninguém
quer agitar idéias; ninguém quer dar a emoção íntima que tem da vida e das coisas. Todos querem "comer"."
"A política republicana", da obra "Marginália" de Lima Barreto
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