24 de fev. de 2009

o homem sem romance #7

"Quando estiver velho estas cicatrizes ainda vão me acompanhar.
O projeto de vida grande falido, os destroços de todas as manhãs que viraram tardes, as noites engolindo manhãs, sugados pela lembrança opaca dessas semanas vagas - cortando vegetais e colhendo cumplicidades pós-sesta.
Tudo afinado enquanto o som do avião demarca nostalgia e o ingresso do corpo moído nas grutas de solidões estampadas, feito mapas em meu rosto.
Tantas histórias de tesouros e extensos territórios que as tuas pernas tremeriam e não me sobraria outro recurso, tampouco remorso, de cortá-las só para lhe mostrar o tamanho exato destas raízes."




12 de fev. de 2009

o homem sem romance #6

Ele precisava das férias forçadas.
Abandonou a esposa numa esquina erma com a sacola de frango frito pingando. Acelerou tudo o que não teve aquele Corcel.
Não tinha fome há anos, não tinha sede, não via silêncio, sossego.
Havia mais fundo nesse poço, mas a coragem já tinha vencido nas contas passadas.
Assim tudo fica muito rápido e fácil de se resolver.

Mirou a única porta que se abria ainda e atirou-se, sem pernas bambas ou colírios navegantes.
Sabia mesmo que seu espírito buscador lhe reservava intempéries, então, largar-se num foda-se, má idéia não seria.
Uma voz de mãe não lhe largava as idéias, num repeat infinito - "da vida, tudo se guarda".
Aguardou.

Ele precisava de férias forçadas, porém, só abriu um dos olhos.
Pôde ver bem simples, um pedaço de frango no seu prato e um outro na boca voraz da mulher.
Desse destino dos frangos todos ali já sabiam soletrar. Até calados.





proje(c)to

etc.